Terminei de Ler: Jane Eyre

Terminei de Ler Jane Eyre
Autor: Charlotte Brontë
Páginas780
Editora: Martin Claret
Jane Eyre, romance de estreia da consagrada e renomada escritora inglesa Charlotte Brontë, narra a história de vida da heroína homônima. Quebrando paradigmas e criticando a realidade vitoriana da época, Jane Eyre desafia o destino imposto às mulheres e as posições sociais que elas deveriam ocupar. Recheado de características góticas, o romance possui personagens inesquecíveis e transformadores, como a figura do misterioso Rochester, patrão de Jane e peça vital da narrativa.


Cuidado, a resenha pode conter alguns spoilers para quem não conhece a história nem por meio das adaptações mais recentes.

“Mas o ódio que o mundo sente será cobrado em sua própria conta.”
Jane Eyre conta a história da jovem Jane Eyre, protagonista a frente de seu tempo, e uma das primeiras mulheres, que mostra que lugar de mulher é onde ela quiser.
Quando jovem, Jane, perde os pais e por isso é obrigada a morar com os seus parentes odiosos, os Reeds. Eles sempre a trataram com desdém, e a única pessoa lá que à tratava bem, seu tio, morre, mas antes faz a mulher prometer cuidar da garota, a tia cuida dela, mas não faz questão nenhuma de fazer a vida dela ser boa. E nem os primos.
Jane encontra um refúgio nos livros, mas por isso, tem uma briga feia com seu primo, e assim vai para um internato. 

“O demônio agarrando o saco que o ladrão carrega às costas. Por essa figura eu passava rapidamente. Era motivo de terror.
O mesmo acontecia com aquela coisa negra com chifres sentada indiferente em uma pedra, observando a distancia a multidão ao redor da forca.
Cada figura contava uma história. Com freqüência era misteriosa para a minha compreensão pouco desenvolvida e meus sentimentos imperfeitos, ainda que sempre profundamente interessante.”
Jane nutre esperanças de que lá, sua vida irá melhorar, mas sua tia, a Senhora Reed, acaba com todas as suas esperanças.

“Enfim, eu devia mesmo temer a Sra Reed ou desgostar dela, pois era de sua natureza ferir-me com crueldade. Jamais me senti feliz em sua presença. Por mais que eu tivesse cuidado para não desobedecê-la, embora me fosse custoso agradar-lhe, meus esforços eram sempre repelidos e pagos com frases como a que acabara de dizer. E agora, pronunciada diante de um estranho, a acusação cortava o meu coração. Percebi vagamente que ela estava destruindo a esperança da nova fase de vida que me estava destinada. Eu sentia, embora não pudesse exprimir meu sentimento, que ela estava semeando aversão e crueldade ao longo do meu caminho futuro. Vi-me transformada, aos olhos do Sr. Brocklehurst, em uma criança nociva e astuciosa. E o que poderia eu fazer para reparar o prejuízo?
‘Nada, realmente’ – pensei, enquanto lutava para conter um soluço.”

No internato, Jane, passa um mês incrível, mas com a volta de Brocklehurst (dono do internato), tempestades caem sobre nossa menina, e a vida dela vira um inferno temporariamente, afinal, mesmo com o plano mesquinho de sua tia e do reverendo Brocklehurst, as outras alunas e professoras, não acreditam que Jane é uma pessoa má, e não a tratam mal.
“- Minhas queridas crianças – prosseguiu o reverendo feito de mármore negro, com pathos, - este é um momento triste, uma ocasião melancólica, pois é meu dever alertá-las que esta menina, que poderia ser um dos cordeiros de Deus, é uma renegada, desgarrou-se do rebanho, e é sem duvida uma intrusa, um ser de natureza diferente. Vocês devem ficar prevenidas contra ela e não devem seguir o seu exemplo. Se necessário procurem evitar a com companhia dela, excluí-la de suas brincadeiras e afastá-la de suas conversas. Professoras, as senhoritas devem vigiá-la. Mantenham seus olhos voltados para os movimentos dela, pensem bem as suas palavras, examinem suas ações, castiguem o seu corpo para salvar a sua alma...”

“- Passou tudo? – perguntou a Srta Temple, olhando para mim. – Já chorou todas as suas tristezas?
- Receio que jamais conseguirei fazer.
- Por quê?
- Porque fui acusada injustamente. A senhora e todo mundo agora pensarão que eu sou uma pessoas malvada.
- Iremos pensar que você é, minha criança, o que você demonstrar ser. Continue a se portar como uma menina boa, que isso é o suficiente para nões.
- Será que consigo, Srta Temple?
- É claro – disse ela, passando o braço em volta de mim...”
Desgraças caem sobre o internato, e com elas várias alunas morrem, incluindo Helen, melhor amiga de Jane, porém mesmo com esse trágico acidente, coisas boas saem daí, as autoridades descobrem a situação das meninas, e fazem mudanças muito boas no internato.
Aqui, a história da um salto no tempo de 8 anos. Descobrimos um pouco do que aconteceu a Jane depois da morte de Helen, como ela se deu bem no internato, e se tornou professora lá e dá aulas por dois anos.
Mas Sra Temple casa, e assim Jane, se sente só, e tem a ideia de trabalhar em outro lugar, ela faz um anúncio no jornal local, e com isso encontra um emprego como governanta e professora em Thornfield Hall.

Lá ele conhece, Adele, sua linda e ingênua aluna, a Sra Fairfield, e posteriormente o senhor da casa, Rochester. 
A sequência em que ela e Rochester se conhecem é engraçada demais e digna de nota:


“- E veio de...?
- Da escola de Lowood, senhor, no condado de Lowton.
- Ah! Uma instituição de caridade. Por quantos anos permaneceu lá?
- 8 anos.
- 8 anos! A senhorita deve ter muita tenacidade na vida. Penso que metade do tempo numa instituição como aquela seria capaz de acabar com qualquer um! Não me surpreende que tenha a aparência de que veio de outro mundo. Fiquei impressionado refletindo de onde a senhorita tinha tirado esse seu rosto. Quando me encontrou ontem à noite na estrada de Hay pensei, nem sei por que, em contos de fadas, e estive a ponto de lhe perguntar se tinha enfeitiçado meu cavalo. Até agora não tenho certeza! Quem são seus pais?
- Eu não tenho pais.
- E nunca teve, suponho. E assim estava sentada lá naquele degrau esperando por amigo?
- Por quem, senhor?
- Os homenzinhos verdes. A noite de luar estava propícia para esse encontro. Será que o interrompi e por isso espalhou aquele maldito gelo sobre o calçamento?
Eu sacudi a cabeça.
- Os homenzinhos verdes abandonaram a Inglaterra há cem anos – disse eu, falando com a mesma seriedade que ele. – E nem mesmo na estrada de Hay ou nos compôs ao longo dela seria possível o senhor encontrar algum vestígio deles. Não creio que a Lua, do verão ou da colheita, ou do inverno, venha a brilhar outras vez sobre as festas que faziam.”
Uma bela amizade brota na relação entre Jane e o Sr Rochester, eles se tornam muito amigos, por Jane ser uma boa ouvinte, Rochester faz ela virar uma boa confidente. E depois de um tempo, Jane começa a nutrir algo além de amizade por ele.

Um mistério no ar paira sobre Thornfield Hall, uma estranha 'aparição' com uma gargalhada demoníaca faz desgraças acontecerem com o Sr Rochester, o que abala a amizade dele e Jane. 
Tudo muda em Thornfield, quando Rochester leva um bando de amigos babacas para lá. E Jane é obrigada a ir em todas as festas com esse povinho mesquinho ala os parentes Reeds. 

Jane se vê confrontada pelo passado, e é obrigada a visitar já tia Reed, que está prestes a morrer, la ela descobre o quão mesquinha sua tia é, mas se por um lado descobre que sua tia não mudou nada, percebe que suas primas mudaram um pouco.

De volta à Thornfield Hall, Jane e Edward se declaram um para outro. Ficamos sabendo o porquê dele ter sido um pouco babaca quando seus amigos estavam com ele, e ele propõe Jane em casamento, mas nem tudo é cor de rosa, uma nuvem negra se abate em Thornfield e um grande segredo é revelado. 
Confrontada com esse terrível segredo, Jane escolhe ir embora, ou melhor fugir. Ela vaga por uns dias, e passa mal na porta da casa de estranhos. Esses estranhos a acolhem e ajudam-na. 
Com o tempo descobrimos os nomes desses benfeitores, os Rivers, John, Diana e Mary. 
Com a ajuda deles Jane abre uma escola para meninas do campo. E temos uma revelação surpreendente sobre seu passado e seus benfeitores.
O que vai acontecer com Jane?
O que ela descobriu sobre seu passado e benfeitores?
Ela voltar a ver o Mr Rochester? Eles iram ser felizes para sempre? 
Para descobrirem a resposta para essas perguntas, caros leitores, terão que ler esse clássico maravilhoso!



“Tem-se a crença de que as mulheres, em geral, são bastante calmas, mas as mulheres sentem as mesmas coisas que os homens. Precisam exercitar suas faculdades e ter um campo para expandi-las, como seus irmãos costumam fazer. Elas sofrem de uma restrição tão rígida, e de uma estagnação tão absoluta, como os homens sofreriam se vivessem na mesma situação. É um pensamento estreito dos seres mais privilegiados do sexo masculino dizer que as mulheres precisam ficar isoladas do mundo para fazer pudins e cerzir meias, tocar piano e bordar bolsas. É fora de propósito condená-las, ou rir delas, se elas desejam fazer mais ou aprender mais do que o costume determinou que fosse necessário para pessoas do seu sexo.”
A protagonista é maravilhosa, Jane desde pequena se mostra uma mulher forte, feminista e a frente de seu a tempo, e por isso é taxada como uma menina má. Mas apesar de sempre ser tratada mau, Jane não desiste de si própria, ela prefere viver com pouco conforto e se dedicar aos estudos, do que viver num teto que não é bem vinda.
Jane busca a independência, e não quer viver a custa dos outros. 

“Sei que há alguma coisa, porque essa possibilidade não soa assim tão atraente. Não me chega como uma palavra igual a liberdade, excitação, entretenimento, que são sons verdadeiramente deliciosos. Mas como meros sons, tão vazios e fugazes, que é total perda de tempo dar ouvido a eles. Mas ocupação! Isto dever ser algo concreto. Qualquer pessoa pode ter uma ocupação. Trabalhei aqui durante 8 anos, agora quero trabalhar em outro lugar. Será que não poderia conseguir coisa alguma coisa que fosse fruto da minha escolha? Isto é uma coisa palpável? Sim, sim, sim, a finalidade não é assim tão difícil se eu possuo um cérebro ativo o bastante para descobrir os meios de alcançá-la.”
Jane se mostra também, uma das pessoas mais boas que já conheci na minha vida de leitor, ela não se mostra uma pessoa mesquinha, e no final da vida de sua tia, tia essa que sempre a tratou mau e que por vingança minou suas chances de se dar bem na vida, a trata bem e a perdoa, eu sinceramente não sei se seria ela numa hora dessas e perdoaria um monstro desses, apesar de fazer sentido, pois Jane cresce e amadurece.
“... Que impressão tão profunda a injustiça que ela lhe fez deixou em seu coração! Não deixo que nenhum tratamento tão cruel assim deixe marcas em meus sentimentos, Você não teria sido mais feliz se tivesse tentado esquecer a severidade dela, junto com as emoções passionais que lhe provocou? A vida me parece curta demais para ser gasta na alimentação da animosidade ou no armazenamento dos malfeitos.” 


Os Reeds, tia e primos de Jane, e suas empregadas, que são os personagens que mais aparecem no arco de Jane antes de ir para internato são odiosos, principalmente os Reeds, mas felizmente o que é deles, está guardado e o destino deles é gratificante para mim, senti uma felicidade enorme em saber o que acontece a esses seres com o passar dos anos! 
Única personagem legal nesse arco é Bessie, a única pessoa que esbanja amor e carinho à Jane Eyre e personagem que ganhou meu coração aos poucos.


No arco de Jane Eyre no internato as coisas são diferentes, mesmo com a tentativa de minar o futuro bom que Jane tem, Sr Brockkehurt, não consegue sucesso.
O pior personagem nesse arco com toda certeza é o Sr. Brocklehurst, homem mesquinho, religioso ao extremo e nojento!

Helen e também, a Senhora Temple, professora chefe do internato, são excelentes pessoas e deixam a vida de Jane muito boa. Fora as outras professoras e alunas, que não acreditam numa só palavra do reverendo. 
“- Esse seu livro é interessante? – já com a intenção de lhe perguntar se depois podia me emprestar-me.
- Gosto dele – respondeu ela, depois de uma pausa de um ou dois segundos, durante os quais me examinou.
- E sobre o que é o livro? – continuei. Não sei de onde tirei a ousadia de iniciar uma conversa com uma estranha. Tal iniciativa era contrária à minha natureza e aos meus hábitos. Mas acho que o fato dela estar com um livro despertou minha simpatia, porque eu também gostava de ler, embora histórias banais e infantis. Eu não podia assimilar ou compreender algo mais sério ou substancial.
- Você pode dar uma olhada, se quiser – respondeu a menina, oferecendo-me o livro.”
Ainda sobre essa parte, ainda tenho que falar sobre Helen, que personagem SENSACIONAL foi ela, uma pena que Charlotte reservou um fim trágico a personagem, porém a morte da mesma, é uma das passagem mais lindas que já li, é maravilhoso, ver que apesar de tudo, da doença contagiosa, Jane Eyre estava junto de sua melhor amiga no adeus à esse mundo: 

“- Estou muito feliz, Jane, e quando você souber da minha morte irá precisar de certeza e não de pesar. Não há por que ficar triste. Todos nós vamos morrer um dia, e a doença que me está levando não é dolorosa. Ela é suave e gradativa. Minha mente está em repouso...”

“- Como me sinto bem! Aquele último acesso de tosse me cansou um pouco. Acho que quero dormir. Mas não vá embora, Jane. Quero que fique junto de mim.
-Ficarei aqui com você, Helen querida. Ninguém irá tirar-me daqui.
- Você está bem aquecida?
- Sim.
- Boa noite, Jane.
- Boa noite, Helen.
Ela me beijou, e eu a beijei, e ambas adormecemos.
Quando acordei já era dia. Um movimento incomum me fez levantar. Olhei para cima. Eu estava nos braços de alguém. A enfermeira me carregava no colo pelo corredor de volta para o dormitório. Não fui repreendida por ter deixado a minha cama. As pessoas tinham outras coisas com que se preocupar. Nenhuma explicação foi dada às minhas perguntas, mas um dia ou dois mais tarde soube que a Srta Temple, ao voltar para o quarto de madrugada, me encontrou deitada no berço com os rosto apoiado no ombro de Helen Burns e meus braços em volta de seu pescoço. Eu estava dormindo e Helen estava morta.”
No arco em Thornfield, os personagens são maravilhosos.
A senhora Fairfax, e um amor de pessoa, de cara já trata nossa protagonista super bem, o que nos faz sentir uma empatia de cara pela senhora.
A senhorita Adele, é um amor de menina, já começamos a narrativa em Thornfield, gostando dessa linda garota francesa e continuamos a gostar dela párea sempre. Ela é tudo o que as Ladys do livro são, mas numa versão menor, o que faz a gente achar fofo e se cativar com essa personagem de cara.

O Sr Rochester, ou Edward, é um homem brusco, sarcástico, porém um amor de pessoa por dentro desta fachada toda. É impossível, não gostar dele logo cara. Porém, mesmo ele sendo isso tudo de bom, ele protagoniza uma cena que me faz desgostar dele por um tempo: 

“- Volte para a sala de visitas. A senhorita está indo embora cedo demais.
- Estou cansada, senhor.
Ele me olhou durante um minuto.
- E um pouco deprimida – disse ele. – O que é que há? Diga-me.
- Não há nada, senhor. Não estou deprimida.
- Afirmo que está. Tão deprimida que, com certeza mais algumas poucas palavras trariam lagrimas aos seus olhos, que estão agora brilhando e nadando. Uma gota escorregou da pestana e caiu no ladrilho. Se eu tivesse tempo e não estivesse com um medo mortal de que algum criado pedante e tagarela passasse, ficaria sabendo o que tudo isso significa. Bem, por esta noite eu a desculpo. Mas entenda que enquanto meus hóspedes estiverem aqui, espero que a senhorita apareça todas as noites na sala de visitas. É um desejo meu. Não deixe de atendê-lo...”
Antes dessa parte, Jane acabou de ser humilhada pelas visitas do Sr Rochester e ele é incapaz de perceber isso, o que me faz duvidar de toda a inteligência que ele mostrou ter. Não consigo entender o porquê dele ter feito o que fez.
Muitas vezes, apesar de amar Sr Rochester, me peguei várias vezes odiando ele por alguma atitude que fez, mesmo sabendo o porquê dessas atitudes.


No arco de Jane em Moor House é recheado de personagens cativantes, como as senhoritas Diana e Mary, o Sr John, a Sra Hannah.
Diana e Mary são uns amores de pessoas, elas tinham tudo para serem soberbas e mesquinhas, mas por infortúnio da vida não são, são humildes, generosas, sabias e ávidas por conhecimento. Diferente da maioria das senhoritas de sua classe que apareceram na vida de Jane, elas são um amor com a Srta Eyre.
O Sr St John, é uma pessoa difícil de descrever, ele é muito calado e na dele, meio brusco e punidor com sigo mesmo, eu não sei bem o que falar dele, pois não sei se gosto dele.


A escrita de Charlotte é maravilhosa e muito contemporânea. Ela consegue fazer uma história de época (para a gente, afinal quando o romance foi lançado não era de época) sem toda a sujeira (estupros, violência) dessa época e coisa sempre lembrada em muitas histórias lançadas por escritores atualmente.
Porém, vi um defeito (não sei se foi da tradução ou dela) em alguns pontos, quando ela coloca endereços, ela não os completou, por exemplo, quando ela recebe a carta do Sr Rochester o endereço dele está incompleto para a gente.
Jane Eyre foi uma história que conheci graças a dois atores que sou fã, Toby Stephens e Michael Fassbender, porém me apaixonei demais quando vi a serie e filmes que foram adaptados com os dois, e fiquei MUITO ansioso para ler o livro.
Eu estava com medo de ler o original, não sei bem o porquê, mas quando eu comecei a ler, não conseguia largar mais esse livro, cheguei a quase madrugar para acabar de ler.
Virei muito fã de Charlotte por causa desse livro e estou muito ansioso para adquirir e ler outras obras dela.

Comparações



Série
Para mim, essa foi a melhor adaptação que vi, a maiorias das coisas foram muito bem adaptadas, mas é claro que temos algumas diferenças, porém poucos, acho que por ser uma serie, em 4 episódios, cada um com aproximadamente 55 minutos, deu para adaptar melhor as coisas.
As diferenças e cortes mais significativos são:
1) O começo é diferente, nele temos uma cena da família Reed posando à uma pintura e o pintor quer a Jane nela, eles falam que ela não faz parte da família.
2) A tia tem a idéia do internato, já no livro idéia parte do farmacêutico que cuida dela depois que ela passa mau no quarto vermelho. No livro tive a sensação que era uma coisa boa, já nas adaptações, uma coisa ruim.
3) O tempo corre no internato, não temos Jane sendo feliz por um tempo, e nem se escondendo do reverendo quando enfim ele vai visitar lá e quando ele a humilha, ninguém pergunta a verdade, isso foi meio inútil afinal não deu em nada.
4) Jane e Helen se torna amigas assim que ela chega lá, pois a garota dorme ao lado. Na sua morte, elas não conversam muito e só dormem.
5) Aqui não temos a Sra Temple, professora administradora do internato, então tudo envolvendo ela não há.
6)Jane tem a idéia de parar de dar aula no internato do nada e quando vai embora é tratada super bem pelas alunas, mas não pelas professoras. A sra Bessie, uma das empregadas dos Reed, não aparece antes da Jane ir embora.
7) A história de Adèle é diferente, aqui a mãe dela teve-a perto de quando deixou o Mr Rochester, e sendo assim ele começou a cuidar dela, nos livros ela já é grandinha quando a mãe vai embora.
8) Quando Jane vai salvar o Mr Rochester de ser queimado, ele acorda rápido e a ajuda à apagar o fogo, no livro ele demora à acordar.
9) Jane conhece o Mr Rochester quando vai à aldeia vizinha levar umas cartas, ele se machuca ao cair do cavalo, série fica parecendo que foi um acidente provocado, sem querer, por ela, ele até a chama de bruxa meio brincando, no livro não rola isso, ele machuca sim, mas só a chama de bruxa em Thornfild.
10) As reuniões com os convidados de Edward são um pouco diferentes, nelas temos uma participação maior de Jane, que é mais incluída nas conversa, e temos uma sequência deles jogando em jogo estilo jogo do copo, essa parte para mim foi mais prazerosa aqui, pois a Srta Blanche é humilhada perto de todos!
11) No livro temos uma cena com uma cigana que lê mãos, lá descobrimos que é o Mr Rochester disfarçado de cigana, na serie ele contrata uma mulher para ser a cigana. Isso eu achei mais plausível aqui.
12) Algumas coisa envolvendo Grace Poole são diferentes, como onde ela fica, quando o Sr Mason se machuca e Jane cuida dele, a porta onde ela fica da umas tremidas. 
13) Uma grande diferença, foi com o personagem Eshton que ganha bastante foque e é um personagem bem legal aqui. 
14) A conversa de Jane e Edward depois do quase casamento deles foi em circunstâncias diferentes, ele não ficou esperando ela na porta dela e sim a chamou e falou da porta mesmo pois ela não quis abrir a porta.
15)
No Livro a passagem dela fugindo e maior e mais detalhada, vemos ela procurando emprego e comida, sem sucesso e no Livro Jane não passa mau e desmaia e é achada por St John, ela acha a casa dele vagando, e vai lá, pede ajuda, a governanta não ajuda, porém ele ouve tudo. Na serie ela chega a ver a casa dele, de longe, mas no caminho desmaia.
16) Alguns acontecimentos na parte de Jane com os Rivers, são fora de ordem, porém nada que afeta o andamento da história. Aqui também temos muitos flashbacks dela com Rochester, no livro ela se lembra dele, mas nada detalhadamente, só ela dizendo que se lembrou e tals.



Filme
Aqui temos bem menos tempo de história, cerca de duas horas, então teremos bem mais cortes e resumos.
Essa adaptação é bem menos fiel ao original, não que isso seja uma coisa ruim, afinal não deixa a história pior.
As mudanças e cortes mais significativos são:
1) O começo, como na série, é bem adaptado, porém como na série, a idéia de levar Jane pro internato, parte da tia Reed, também.
2) No internato, temos também a cena de Jane sendo humilhada, ela é um pouco mais fiel ao original, mas como na série, não serve para nada.
3) Como na série, a cena dela salvando o Mr Rochester é diferente, com ele acordando e a ajudando apagar o fogo. 
4) Temos um corte enorme na história nas partes das festinhas do Mr Rochester com seus convidados em Thornfield Hall. O que para mim não foi ruim, afinal não curto essas partes no livro. 
5) Tudo envolvendo Grace Poole e seu mistério, é bem mais resumido aqui, temos só o básico do básico desse plot. 
6) A maior diferença na adaptação, está mais para o final, quando Jane conhece os Rivers. No livro (e na série) quando Jane descobre que está rica, porque seu tio morreu e lhe deixou uma herança, também descobrimos que esse tio é tio dos Rivers, sendo assim St John, Diana e Mary dá os primos dela, e assim para agradecer e ajudar eles, ela resolve dividir a herança, aqui, NÃO TEMOS isso, ela resolve dividir o dinheiro porque, pelo visto é bondosa demais.
7) Ela encontra os Rivers no começo do filme, então o resto da história são flashbacks, depois a história se encaixa com o presente.
8) Quando Jane resolve voltar a Thornfield Hall, ela encontra uma velha conhecida, e ela conta tudo o que aconteceu depois de sua saída (isso eu gostei mais, pois gostava dessa personagem), depois Jane se reencontra com Edward e conversam e só, o filme acaba aqui. No livro é na série, descobrimos e vemos mais coisas depois disso tudo.

Bem na medida do possível, ambas as adaptações soa boas e fiéis, acho que a grande diferença delas para a obra original feita por Charlotte, é na aparência dos personagens, para mim beleza é um termo bem relativo, o belo para mim pode ser feio para vocês e vise versa.
Jane é descrita como uma mulher feia e sem atrativos, na adaptação feita em série, ela foi feita por Ruth Wilson, e não viu mentir, a atriz é bem bonita.


A mesma coisa aconteceu na adaptação em filme de 2011, Jane foi feita por Mia Wasikowska, ou Alice para os íntimos, e a Mia é ainda mais bonita. 



Edward é descrito como um homem de rosto feio, mas corpo bonito e atlético, na série, ele foi feito por Toby Stephens, que não é nada feio, para mim.


No filme de 2011, quem dá vida ao personagem é Michael Fassbender, que também é lindo.


Por ter lido o livro depois de ver as duas adaptações, eu meio que imaginei o personagem como uma versão Corcunda de Notre Dame dos dois atores.
Outros personagens também são um pouco diferentes, mas preferi falar sobre os 2 só. 


Lembrando, o clássico ainda tem outras adaptação mais antigas.

QUOTES


“O mundo pode não gostar de ver esses conceitos separados uma vez que se acostumou a vê-los fundidos num só por achar conveniente fazer que pela aparência externa se avalie o conteúdo – deixar que paredes caiadas de branco assegurem a pureza de um santuário. Pode-se odiar aquele que ousa avaliar ou expor – destrói o revestimento dourado e mostra a estrutura metálica por baixo dele -, profana o sepulcro e revela as relíquias das urnas. Mas o ódio que o mundo sente será cobrado em sua própria conta.”

 “Tantas vezes lhe havia pedido permissão para segurar nas mãos esse prato a fim de examiná-lo mais de perto, o que até então sempre me fora negado como se eu fosse indigna de tal privilégio. E agora esse precioso recipiente estava no meu colo, e eu estava sendo cordialmente convidada a comer o delicado pedaço da torta que repousava sobre ele. Generosidade inútil! Vinda tarde demais, como a maioria das outras generosidades muito desejadas e quase sempre adiadas! Eu não podia comer aquela torta. E a plumagem do pássaro e as cores das flores pareciam estranhamente desbotadas!”

“- Fantasma! O quê? Então você é realmente um bebê! Tem medo de fantasmas?
- Do fantasma de Sr. Reed, tenho sim. Ele morreu naquele quarto e ficou deitado lá. Se puder ser evitado, nem Bessie nem ninguém mais entra lá depois que escurece. E foi um crueldade me deixarem trancada lá, sozinha, sem ao menos uma vela – foi tão cruel que será impossível esquecer.
- Tolice! E é isso que a faz sentir-se tão infeliz? Está com medo agora à luz do dia?
- Não, mas a noite não tarda a voltar. E, além disso, sou muito infeliz – sou muito infeliz por outras coisas.
- Que outras coisas? Você pode dizer-me alguma delas?
Como gostaria de responder plenamente a essa pergunta! Como era difícil formular qualquer resposta! As crianças podem sentir, mas não conseguem analisar seus sentimentos. Se a análise é feita parcialmente em pensamento, não sabemos como expressar o resultado desse processo em palavras. Entretanto, temendo perder essa primeira e única oportunidade de desabafar a dor que sentia, depois de uma pausa apreensiva, consegui formular uma resposta incipiente que, no entanto, até onde foi possível, era verdadeira.
- Por um único motivo, não tenho pai ou mãe, irmãos ou irmãs.”

“- Não sei, uma vez perguntei à tia Reed e ela disse que é provável que eu tenha parentes pobres, afastados, com o sobrenome Eyre, mas ela não sabe nada sobre eles.
- Caso existam, você gostaria de viver com eles?
Eu refleti. Se para gente grande a pobreza parece terrível, imagine para as crianças. Elas não têm muita noção do que seja uma pobreza digna, trabalhadora e respeitável. Pensam na palavra apenas como sinônimo de roupas esfarrapadas, comida escassa, lareiras apagadas, maneiras rudes e vícios desprezíveis. Para mim a pobreza era um sinônimo de degradação.
- Não, não gostaria de viver entre os pobres – foi a minha resposta.”

“Além do mais, a escola poderia trazer uma mudança completa. Implicava uma longa viagem e a separação completa de Gateshead. A entrada em uma nova vida.
- Por certo eu gostaria de ir para a escola.
Foi essa a conclusão a que cheguei após minhas reflexões.”

“Junto comigo levava sempre a minha boneca. Os seres humanos devem ter a quem amar, e, na falta de objetos mais dignos de afeição, eu me contentava em encontrar prazer no amor e carinho de uma imagem desbotada e surrada como a miniatura de um espantalho. Hoje fico surpresa ao lembrar com que sinceridade absurda eu era louca por aquele pequeno brinquedo, um pouco imaginando que a boneca estava viva e era capaz de sentimentos. Não conseguia dormir a não ser que ela estivesse grudada na minha camisola. E, enquanto se mantivesse ali, quieta e quente, eu me sentia feliz, acreditando que o mesmo acontecia com ela.”

“Benfeitora! Benfeitora! – falei dentro de mim. - Todos chama a Sra Reed de minha benfeitora. Se for assim, benfeitora significa algo desagradável.”

 “- Não sou dissimulada. Se fosse, diria que a amo, mas declaro não ter amor pela senhora. Detesto-a mais do que a qualquer coisa pior neste mundo, exceto John Reed. E este livro sobre a mentirosa a senhora pode dar para a sua filha Georgiana, pois é ela que conta mentiras, e não eu.”

“- Estou feliz porque a senhora não é minha parenta. Jamais voltarei a chamá-la de tia enquanto eu estiver viva. Jamais virei vê-la depois que crescer. E se alguém me perguntar o quanto eu gosto da senhora, e de como era tratada pela senhora, direi que qualquer pensamento sobre a senhora me faz ficar doente, e que a senhora me tratava com extrema crueldade.
- Como ousa afirmar essas coisas, Jane Eyre?
- Como ouso, Sra Reed? Como ouso? Porque essa é a VERDADE. A senhora pensa que eu não tenho sentimentos e que posso ser tratada sem um pingo de amor ou gentileza. Mas não posso viver dessa maneira e a senhora não tem compaixão... As pessoas pensam que a senhora é uma boa mulher, mas a senhora é má, não tem coração. A senhora é que é a dissimulada!”

“- Sua coisinha desobediente! – disse ela. – Por que não vem quando é chamada?
Comparada com os pensamentos que estivera remoendo, a presença de Bessie parecia animadora, embora, como de costume, ela estivesse zangada. A questão era que depois do meu embate vitorioso com a Sra Reed, eu não estava disposta a ligar muito para a zanga passageira da governanta. Mas estava disposta a me aconchegar em seu coração jovem e iluminado. Abracei-a e disse:
- Ora, Bessie, não se zangue!
Aquele ato foi mais espontâneo e destemido do que qualquer outro que eu me permitia. De alguma forma ela gostou.
- Você é uma criança estranha, Senhorita Jane – disse ela ao me olhar. – Irrequieta e solitária, e em breve irá para a escola, não?
Eu assenti.
- E não ficará triste por abandonar a pobre Besie?
- E Bessie liga para mim? Ela está sempre ralhando comigo.

“- Bessie, tem de me prometer que não vai ralhar comigo até o dia em que eu for embora.
- Bem, farei isso. Mas desde que se comporte e não tenha medo de mim. Não rebata, quando eu falar com você de um modo um pouco mais ríspido. Este jeito é só provocante.
- Acho que não vou mais ter medo de você, Bessie, porque já estou acostumada com seu jeito. Tenho receio das pessoas do outro grupo que conhecerei em breve.
- Se você demonstrar esse receio, elas não vão gostar de você.
- Como você, Bessie?
- Eu não desgosto de você, senhorita. Tenho mais afeição por você do que por todas as outras.
- Mas não demonstra.
- Sua engraçadinha! Você está falando de um modo diferente. O que a faz assim tão despachada e atrevida?
- Porque em breve estarei longe de você, e além do mais...
- Então está feliz em me deixar?
- De jeito nenhum, Bessie. Sem dúvida, estou é triste.
- Quem diria! Sem dúvida! Com que calma esta minha senhorinha diz isso! Aposto que se eu fosse lhe pedir um beijo você não me daria. Diria que sem dúvida não me beijaria.
- Beijarei sim, com prazer. Abaixe a cabeça.
Bessie inclinou-se para a frente e nos abraçamos. Voltei para dentro de casa junto dela, muito confortada. Aquela tarde transcorreu em paz e harmonia, e à noite Bessie contou-me algumas de suas histórias mais encantadoras e cantou algumas de suas mais doces canções. Até mesmo para mim a vida tinha apresentado seus raios de sol.”

 “É bem provável que, se eu tivesse deixado um lar acolhedor e pais bondosos recentemente, aquela teria sido a hora em que inconformada, lamentaria a separação. Aquele vento me entristeceria o coração. O caos no escuro teria perturbado a minha paz. Porém o que aconteceu foi que recebi de ambos um estímulo estranho, espontâneo e agitado, e desejei que o vento uivasse com mais força, que a obscuridade se aprofundasse em escuridão e que a confusão se erguesse num clamor.”

“- Então, com a Senhorita Temple você é boa, não?
- Sim, com naturalidade. Não faço esforço nenhum, sigo por onde a tendência me guia. Não há mérito nesse tipo de virtude.
- Há bastante. Você é boa com aqueles que são bons com você. E isso é tudo que sempre desejei ser. Se as pessoas fossem sempre gentis e obedientes para com aqueles que são cruéis e injustos, os maus teriam sempre um ganho, nunca sentiriam medo, jamais se alterariam, mas sua maldade cresceria cada vez mais. Quando somos atingidos sem razão, devemos revidar com muita força. Tenho certeza de que devemos revidar com tamanha força que ensinemos a pessoa que nos agrediu nunca mais fazer tal coisa.
- Você irá mudar de idéia, espero, quando for mais velha. Por enquanto não passa de uma garotinha inculta.
- Mas eu sinto isso, Helen. Não posso senão detestar aqueles que, por mais que eu faça para agradar, insistem em não gostar de mim. Devo resistir àqueles que me castigam injustamente. Isso é tão natural quanto amar os que demonstram afeição, ou aceitar o castigo quando sinto que é merecido.”

“Nós somos e devemos ser, uma e todas neste mundo, pessoas carregadas de defeitos.”

 “- Que ela fique mais meia hora nesse tamborete e que ninguém lhe dirija a palavra durante o resto do dia.
Lá fiquei eu, encarapitada no alto. Eu que dissera que não suportaria a vergonha de ficar de pé de castigo no meio da sala, estava agora exposta à vista de todas num pedestal de infâmia. As sensações que eu sentia não poderiam ser expressas em nenhum idioma. Mas, assim que todas se levantaram, sufocando minha respiração e apertando minha garganta, uma menina veio na minha direção e passou por mim, e ao passar, levantou os olhos e me olhou. Que luz estranha aquele olhar causou! Que sentimento extraordinário aquele raio despertou em mim! Como aquele novo sentimento me confortou! Era como se um mártir, um herói, tivesse passado por um escravo ou uma vítima, e ao passar lhe transmitisse sua força. Dominei a crescente histeria que sentia, ergui a cabeça e ajeitei com firmeza o corpo sentado no banco.”

“Ao fazer uma pergunta inocente sobre o trabalho que fizera para a Srta Smith, Helen Burns foi censurada pela trivialidade das questões levantadas. Ao voltar para o seu lugar passou por mim e sorriu. Que sorriso! Lembro-me dele agora. Sei que eram as emanações de um intelecto refinado, de uma coragem verdadeira, que iluminavam suas feições, seu rosto fino, seus olhos fundos e cinzentos, como o reflexo de um anjo.”

“Até aquele momento Helen Burns usava em volta do braço uma faixa de ‘DESLEIXADA’. Há menos de uma hora eu a ouvira ser condenada pela Srta Scatcherd a um jantar de pão e água no dia seguinte, porque borrara um exercício ao copiá-lo. Como a natureza do homem é imperfeita! Há pontos que estão lá na superfície do planeta brilhante. E os olhos da Srta Scatcherd só conseguem enxergar defeitos diminutos e estão cegos para a imensidão brilhante dos astros.”

“- Helen, por que você está aqui com uma menina que todo mundo acredita ser uma mentirosa?
- Todo mundo, Jane? Ora, havia somente 80 pessoas nesta sala que ouviram você ser chamada assim, e o mundo tem centenas de milhões de pessoas.
-Mas o que eu tenho a ver com milhões de pessoas? As 80 eu sei que me desprezam.
- Você está enganada, Jane. É bem provável que ninguém na escola a despreza ou desgoste de você. Muitas, eu tenho certeza, sentem uma enorme pena de você.
- Como podem ter pena de mim depois do que o Sr Brocklehurst falou?
- O Sr Brocklehurst não é Deus, nem sequer é um grande homem ou mesmo um homem admirável. E por aqui é pouco querido. Nunca fez nada para que gostassem dele.”

 “... Mas fiquei impressionada e maravilhada com Helen.
A refeição confortante, o fogo brilhante, a presença e a gentileza de sua amada instrutora, ou talvez, mais do que isso, alguma coisa muito genuína em sua mente tinha ativado suas forças interiores. Ela despertaram e se inflamaram. De início avivaram a cor do seu rosto, que até então eu só vira pálido e macilento. Depois brilharam em seus olhos, que de pronto adquiriram uma beleza mais singular do que a da Srta Temple. Uma beleza que não era nem pela cor nem pelas pestanas compridas ou pelas sobrancelhas desenhadas, mas sim uma beleza de significado, de movimento, de esplendor. Então sua alma aflorou de seus lábios e a linguagem fluiu não sei dizer de onde. Como uma menina de 14 anos podia ter um coração grande suficiente, vigoroso o suficiente para conter a expansão da energia da mais pura, completa e sincera eloqüência? Assim foi, para mim, a qualidade das palavras de Helen naquela noite memorável. Seu espírito parecia apressado em viver dentro de um instante breve o tanto que muitos vivem durante uma existência prolongada.”

“Na manhã seguinte, a Srta Scatcherd escreveu em letras grandes num pedaço de papelão a palavra ‘DESLEIXADA’ e prendeu-o em volta da testa larga e inteligente de Helen como se fosse um amuleto. Ela usou aquilo até a noite, pacientemente, e sem rancor, por ter considerado o castigo merecido. No momento em que a Srta Scatcherd se retirou depois das aulas, corri até Helen, retirei aquilo, rasguei e atirei na lareira. A fúria que ela era incapaz de expressar queimou em minha alma durante o dia todo, e lagrimas contínuas e grossas e quentes arderam em meu rosto, pois os espetáculo da sua triste resignação provocou uma dor intolerável do meu coração.”
 “Sorri para Bessie ao ouvir sua resposta franca. Senti que estava sendo honesta, mas confesso que não fiquei indiferente à importância da sua apreciação. Aos 18 anos a maioria das pessoas deseja agradar aos outros, e a convicção de que não se tem uma aparência capar de cooperar com esse desejo não é nada gratificante.”

“Um novo capítulo num romance é como um novo ato de uma peça de teatro.”

“Queria mais interação com pessoas como eu, queria conhecer outras pessoas diferentes daquelas que estavam ali ao meu alcance. Eu valorizava o que a Sra Fairfax e Adèle tinham de bom, mas acreditava na existência de outros tipos de bondade mais interessantes, que eu queria apreciar.
Quem me culparia por isso? Sem dúvida muita gente. E ainda por cima eu seria chamada de insaciável. Não podia evitar. A inquietação fazia parte da minha natureza, mesmo que algumas vezes até me causasse sofrimento. Então meu único alívio era caminhar para lá e para cá ao longo do corredor do 3º pavimento, protegida pelo silêncio e pela solidão daquele lugar. E permitia que o olhar da minha mente viajasse pelas lindas visões que surgiam à sua frente. E com certeza eram tantas e tão efusivas, que deixavam meu coração exultante em completa agitação, porém também expandiam a vida e, o melhor de tudo, abriam o meu ouvido interior para uma história que nunca terminava, uma história criada pela minha imaginação, cuja narrativa era ininterrupta. Uma história estimulada por todos os acontecimentos, vida, fogo, sentimento que eu desejava e até então não tinha experimentado em minha existência.”

“É inútil dizer que os seres humanos deveriam contentar-se com a tranqüilidade. Eles precisam da ação. E, se não a encontram, irão criá-la. Milhões estão condenados a um destino mais pacato que o meu, e milhões vivem uma revolta silenciosa contra sua sorte. Ninguém sabe quantas revoltas, além das revoltas políticas, fermentam na multidão da vida das pessoas na Terra.”

 “- Obrigado. Pode deixar comigo. Não tenho nenhum osso quebrado, apenas alguma torção – e levantou-se outras vez experimentando o pé, mas o resultado produziu um involuntário ‘Ai’...
Peguei o regalo e continuei minha caminhada. Aquele incidente veio e passou por mim. Foi um incidente sem relevância, sem romantismo, sem maiores interesses. Contudo, um simples momento deixou a marca de mudança em uma vida monótona. Minha ajuda fora necessária e requisitada. E eu a dei. Foi prazeroso sentir que havia feito alguma coisa, embora trivial e passageira. Foi uma participação ativa, e eu estava cansada de uma existência totalmente passiva.”

“Ainda havia um pouco de luz do dia, e a Lua estava brilhante e polida. Eu podia vê-lo com alguma clareza. Seu corpo estava coberto por uma capa com gola de pele e fecho de metal, própria para cavalgar. Certos detalhes não eram visíveis, mas deu para ver a sua altura e a largura do seu peito. Seu rosto era moreno, com traços duros e cenho pesado. Seus olhos e sobrancelhas juntos mostravam que naquele momento estava irado. Já não era jovem, entretanto não chegara à meia-idade. Talvez tivesse uns trinta e cinco anos, ou perto disso. Não senti medo dele, apenas uma leve timidez.”
“O Sr. Rochester estava reclinado num sofá com o pé apoiado numa almofada. Olhava para Adèle e para o cão. O fogo brilhava forte, iluminando seu rosto. Reconheci meu viajante com sobrancelhas espessas e salientes, a testa quadrada, mais quadrada ainda pelo penteado que colocava seu cabelo preto repartido para o lado. Reconheci seu nariz decidido, mais notável por sua personalidade do que por sua beleza. Suas narinas grandes, que pensei que fossem a marca de um temperamento irascível, sua boca austera, o queixo e o maxilar, que, sem duvida, guardavam, os 3, um aspecto severo. Percebi que seu corpo, agora sem a capa, se enquadrava em harmonia com sua fisionomia. Suponho que aquela fosse uma figura digna de um atleta. Peito largo, flanco estreito, porém não era alto e tampouco gracioso.”

 “- Sim, sim, a senhora tem razão. Tenho muitos defeitos, bem sei, e lhe garanto que não desejo amenizá-los. Deus sabe que eu não preciso ser tão severo para com os outros. Tenho uma existência anterior. Uma série de atos, uma vida manchada a contemplar dentro do peito que bem poderiam ser chamados de escárnio e de censura de meus vizinhos para comigo. Eu comecei, ou melhor, fui empurrado para um rumo errado. Assim como outros infratores, gosto de colocar metade da culpa na má sorte e nas circunstancias adversas. Isso foi aos 21 anos, e desde então jamais voltei para o bom caminho. Mas eu poderia ter sido muito diferente. Poderia ter sido tão bom quanto a senhorita. Mais sábio. Quase tão sem máculas. Invejo-a, invejo sua paz de espírito, suas consciências limpa, sua memória impoluta. Minha jovem, uma memória sem máculas e não contaminada dever ser um tesouro raro, uma fonte inesgotável de puro refrigério, não é?
- Como era a sua memória aos 18 anos, senhor?
- Muito boa naquela época. Límpida, saudável. Nenhum jorro de água pútrida a transformara em poça de água fétida. Aos 18 anos eu era como a senhorita. Era igual. A natureza fez que eu fosse, no geral, um homem bom, Srta Eyre. Um dos melhores, e veja que já não foi assim. A senhorita poderia mesmo dizer que nada vê. Pelo menos me sinto lisonjeado por ler isso em seus olhos.”

“O remorso é terrível quando somos levados ao erro, Senhorita Eyre. O remorso é o veneno da vida.
- Dizem que o arrependimento é a sua cura, senhor.
- Não, não é a sua cura. A transformação, sim, pode ser a sua cura. E eu poderia transformar-me, ainda tenho força para isso, se... Mas para que pensar sobre isso, impedido, oprimido, amaldiçoado com o estou? Além do mais, como a felicidade me é irrevogavelmente negada, tenho o direito de extrair prazer da vida, e IREI fazê-lo, custe o que custar.
- Assim o senhor irá degenerar-se ainda mais.
- Pode ser que sim. Mas o que isso importa se eu puder obter prazer novo e doce? E posso obtê-lo tão novo e doce quanto o mel silvestre que a abelha acumula na charneca.
- Ela o irá picar e o mel terá gosto amargo, senhor.
- Como a senhorita sabe? A senhorita nunca o provou. A senhorita parece tão séria e solene, mas é tão ignorante sobre essas coisas quanto este camafeu – e pegou um que estava na prateleira sobre a lareira. – Não tem qualquer direito de me passar um sermão, sua neófita, que ainda não passou pelo pórtico da vida e desconhece completamente os seus mistérios.
- Lembro-lhe apenas suas próprias palavras. O senhor disse que seus erros lhe trouxeram o remorso e que o remorso é o veneno da existência.”

“Quando eu recebia um convite formal para encontrá-lo, era sempre honrada por sua cordialidade ao receber-me, o que me fazia sentir que realmente tinha o poder de entretê-lo e que essas conversas à noite eram promovidas tanto para o seu prazer como para meu benefício.
Na verdade, em comparação com ele, eu falava pouco, mas o ouvia falar com gosto. Ele era comunicativo por natureza. Gostava de abrir para estranhos um mundo de vislumbres de cenas e costumes do mundo, não me refiro a suas cenas corruptas e costumes perversos, mas, sim, ao que era extraído de grandes acontecimentos e das novidades estranhas que os caracterizam. E eu tinha uma grande satisfação em receber as idéias novas que me oferecia, em imaginar as imagens que me descrevia, seguindo-o em seus pensamentos por novas regiões que me eram reveladas, sem nunca me assustar ou aborrecer com alguma alusão perniciosa.”

“A naturalidade de suas maneiras me libertava de restrições dolorosas. A franqueza amistosa, correta e cordial com a qual me tratava aproximou-me dele. Algumas vezes sentia como esse ele fosse mais um parente meu do que meu patrão. Ainda assim às vezes era autoritário, mas isso não me incomodava, pois via que esse era o seu jeito. Tão feliz e gratificada fiquei com esse novo interesse pela vida, que deixei de lamentar a morte de parentes. A fina lua crescente do meu destino parecia alargar-se. Os hiatos da minha existência foram preenchidos...”

“E agora aos meus olhos o Sr. Rochester continuava feio? Não, leitor, a gratidão associada a outras coisas, todas agradáveis e calorosas, fizeram de seu rosto a coisa que eu mais gostava de ver. A presença dele numa sala era mais animada do que o fogo mais brilhante de uma lareira. Eu não havia esquecido seus defeitos e na verdade não poderia, pois ele os colocava com freqüências diante de mim. Era orgulhoso, sardônico, ríspido com aqueles que eram inferiores a ele. Secretamente, em minha alma, eu sabia que sua grande bondade para comigo era contrabalançada por uma severidade injusta para com muitos outros. Era também mal-humorado, assim, sem motivo algum. Mais de uma vez, quando fui chamada para ler para ele, encontrei-o sentado sozinho na biblioteca com a cabeça baixa enfiada entre os braços. E quando a levantava uma carranca quase maligna escurecia suas feições.”

“Mas eu acreditava que seu mau humor, sua rispidez e seus defeitos morais do passado, digo passado porque agora parecia tê-los corrigido, tinham origem em alguma encruzilhada cruel do destino. Acreditava que ele era por natureza um homem de melhores tendências, princípios nobres e gostos refinados do que os que foram desenvolvidos pelas circunstancias, instigados pela educação ou encorajados pelo destino. Achava que nele havia uma índole e um excelente caráter mesmo que ainda permanecessem um tanto prejudicados e confusos. Não posso negar que eu sofria por seu sofrimento, o que quer que fosse, e que faria tudo para mitigá-lo.”

“Mal um sonho se aproximou de meus ouvidos e se dissipou amedrontado, atemorizado por um incidente de arrepiar.
Era uma gargalhada demoníaca – baixa, abafada e profunda – que saía, ao que parecia, pelo buraco da fechadura da porta do meu quarto...”

“Eu sabia – continuou ele – que, de algum modo, a senhorita iria fazer-me bem de alguma forma, em algum momento. Vi isso em olhos quando a olhei pela primeira vez. A expressão do seu olhar e o seu sorriso não...
- Não – continuou apresado – trouxe prazer ao fundo do meu coração à toa. As pessoas falam de simpatia natural. E já ouvi falar de gente de bom gênio. Há pequenas verdades nas fábulas mais loucas. Minha cara salvadora, boa noite!”

“A maior verdade é que a beleza está nos olhos de quem vê. O rosto sem cor do meu patrão, suas faces cor de oliva, a testa grande e quadrada, as sobrancelhas espessas e negras, os olhos profundos, trações fortes e firmes, boca rígida – rosto repleto de energia, decisão e poder – de belo não tinha nada, segundo a convenção para o modelo de beleza. Porém, para mim era mais do que bonito. Nele transbordava um interesse e uma influência que me dominavam, que tiravam meus sentimentos do meu próprio poder e os acorrentavam ao dele. Não tive a intenção de amá-lo. O leitor sabe o quanto lutei pata extirpar da minha alma os germes do amor que lá descobri. E agora, vendo-o outra vez, espontaneamente renasciam viçosos e fortes! Ele me fez que o amasse sem mesmo reparar em mim.”

“... Eu não simpatizei com a aparência e a expressão de nenhum deles, embora imaginasse o quanto agradariam à maioria das pessoas, que os qualificaria como atraentes, elegantes, pomposos. Ao mesmo tempo que poderiam dizer que o Sr. Rocherter possuía traços desagradáveis e uma aparência melancólica.”

“Eu os observava aos sorrisos e gargalhadas, e isso não significava nada para mim. A luz das velas tinha mais alma do que os sorrisos deles. O ruído da sineta era tão significativo quanto suas gargalhadas. Vi o Sr. Rochester sorrir, seus traços rígidos se tornaram suaves, seu olhar ficou mais brilhante e gentil, e ambos irradiavam doçura e perspicácia.”

“Ele estava falando naquele momento com Louisa e Amy Eshton. Fiquei imaginando se poderiam receber com calma aquele olhar que para mim parecia tão penetrante. Esperei vê-las baixar os olhos e corar e fiquei satisfeita ao ver que nada disso aconteceu. Pensei: ‘ele não significa para elas o mesmo que significa para mim. Então não é do tipo delas, e creio que é do meu. Tenho certeza que é. Tenho afinidades com ele e entendo a linguagem de seu semblante e de seus movimentos. Tenho algo na cabeça e no coração, no meu sangue e nervos que me sintoniza mentalmente com ele, embora a classe e a riqueza nos separem bastante. Há alguns dias eu não havia dito que não tinha nada a ver com ele exceto receber de suas mãos o meu salário? Proibi-me de pensar nele de qualquer outro modo que não fosse o de um patrão. Foi uma blasfêmia contra a natureza! Todos os sentimentos bons, verdadeiros e fortes que tenho se unem impulsivamente ao redor dele.”

“Sei que devo ocultar meus sentimentos, devo reprimir as esperanças, devo lembrar-me de que ele não pode interessar-se muito por mim. Quando digo que sou do mesmo tipo que ele, não quero dizer que eu tenha sua capacidade de influencias e seu poder de atrair. Quero dizer apenas que tenho certos gostos e sentimentos em comum com ele. Devo, então, repetir sem parar que estamos separados para sempre. E que ainda assim enquanto puder respirar e pensar, eu irei amá-lo.”

 “Em tais circunstâncias não havia nada capaz de esfriar ou mesmo acabar com o amor que eu sentia, apesar do imenso desespero que me causava. Como deve notar, leitor, essa provocação demais. Como uma mulher na minha posição tinha a ousadia de sentir ciúme de outra como a Srta Ingram? Mas eu não sentia ciúme. Só raramente. A natureza da dor que eu sofria não podia ser explicada por essa palavra. A Srta Ingram estava um ponto abaixo da escala do ciúme. Era inferior demais para provocar tal sentimento. Perdoe-me este aparente paradoxo. Mas sei da razão por que disse isso. Ela era muito exibida, mas não era autentica. Tinha uma bela aparência, muitos dotes brilhantes, mas sua mente era pobre, seu coração era estéril por natureza. Nada brotava espontaneamente naquele solo. Não havia nela nenhum frescor que tornasse delicioso qualquer fruto natural. Ela não era uma pessoa boa, não era original. Costumava repetir frases feitas tiradas de livros. Não apresentava nem tinha uma opinião que fosse própria. Defendia o mais alto grau de sentimentos, mas não conhecia os sentimentos de benevolência e compaixão. Nela não havia ternura e verdade.”

“- Gostaria de saber com que sentimentos a senhorita veio até mim esta noite – disse ela, depois de examinar-me por certo tempo. – Gostaria de saber que pensamentos ocupam o seu coração durante todas as horas em que esteve sentada no outro salão com aquela gente fina esvoaçando na sua frente como sombras de uma lanterna mágica. Há tão pouca identidade entre vocês, que é como se elas fossem meras sombras de formas humanas sem substâncias concreta.”

“- Sinto-me cansada, às vezes com sono, mas raramente triste.
- Então a senhorita tem alguma esperança secreta que a anima e estimula com murmúrios do futuro?
-Não. A maior esperança que tenho é de economizar dinheiro suficiente para montar algum dia uma escola e uma pequena casa alugada por mim mesma.”

“Os pressentimentos são coisas estranhas! Assim como as afinidades e os presságios. E essas 3 coisas, se combinadas, formam um mistério para qual a humanidade ainda não descobriu a chave.”

“- Virá até a sala de visitas depois do jantar?
- Não, senhor, preciso preparar-me para a viagem.
- Então devemos nos despedir por enquanto?
- Suponho que sim, senhor.
- E como é que as pessoas realizam esse rito de despedida, Jane? Ensine-me, que não sei como fazer.
- Elas dizem adeus, ou outra palavra que prefiram.
- Então diga.
- Adeus, Sr Rochester, por enquanto.
- E o que eu devo dizer?
- A mesma coisa, caso queira, senhor.
- Adeus, Srta Eyre, por enquanto. É só isso?
- Sim.
- Em minha opinião isso me parece escasso, seco e pouco amistoso. Gostaria de ter algo mais. Algo que pudesse ser acrescentado ao rito. Se apertássemos as mão, por exemplo. Mas não, também não iria contentar-me com isso. Então a senhorita não faz mais nada do que dizer adeus, Jane?
- Basta isso, senhor. Uma palavra sincera pode transmitir tanta boa vontade como muitas.
- É provável que sim, mas a palavra adeus é vazia e fria.”
“Iria servir-me ao lado da lareira, disse ela. E colocou diante de mim uma pequena mesinha redonda com minha xícara e um prato de torradas, igualzinho ao que fazia, ao me favorecer com uma gulodice furtada e servida às escondidas numa cadeira do quarto de brinquedos. E eu sorri e obedeci, como fazia naquele tempo.”

“Ela quis saber se eu estava feliz em Thornfield Hall, e que tipo de pessoa era a minha patroa. E quando disse a ela que havia apenas um patrão, quis saber se ele era um cavalheiro gentil, e se eu gostava dele. Eu lhe disse que ele era um homem bem feio, porém um cavalheiro, e que me tratava com gentileza e que eu estava contente.”

“No momento seguinte lá estava eu naquele aposento. Todas as peças do mobiliário pareciam estar do mesmo jeito que estavam naquela manhã em que eu fui apresentada ao Sr Brocklehurst. O tapete ao qual ele ficara parado ainda cobria o piso diante da lareira. Olhando para os armários de livros pensei poder distinguir os 2 volumes dos Pássaros Ingleses de Bewick no mesmo lugar na 3 prateleira, e As Viagens de Gulliver e As Mil e Uma Noites na prateleira logo acima. Aqueles objetos inanimados não haviam mudado. Porém as coisas vivas pareciam ter alterado a visão do passado.”

“Bem me lembrava do rosto da Sra Reed e procurei ansiosamente a imagem conhecida. É uma dádiva ver o tempo sufocar os desejos de vingança e silenciar os arroubos de raiva e aversão. Cheia de ódio e amargor havia deixado essa mulher e voltava para ela agora sem outra emoção que não fosse uma espécie de pesar pelo seu sofrimento e uma vontade imensa de esquecer e perdoar todas as ofensas, de me reconciliar com ela e apertar sua mão como amiga.”

“Sentimentos verdadeiros e generosos são considerados sem importância para algumas pessoas, mas ali estavam pessoas de duas naturezas diversas. Uma intoleravelmente ácida, e outra miseravelmente insossa, às quais tais sentimentos faziam falta. Sentir sem antes julgar é como beber algo sem gosto, mas julgar sem sentimento é demasiado amargo e rascante para ser engolido.”

“Não sabia como as pessoas se sentiam ao voltar para casa depois de uma ausência, fosse ela longa ou curta, jamais experimentara esse sentimento. Sabia como era voltar para Gateshead, quando era criança, depois de um longo passeio e ser repreendida por parecer fria e sombria. E mais tarde, como era voltar da igreja em Lowood, ansiosa por uma refeição farta e um bom fogo e não ter nenhuma dessas duas coisas. Nenhum desses retornos era muito agradável ou desejável. Não havia uma bússola que me levasse para um ponto determinado, aumentando seu poder de atração à medida que eu dele me aproximara. Voltar a Thornfield ainda era algo a ser experimentado.”

“Mas existe algo mais teimoso do que a juventude? Algo mais cego do que a inexperiência? Essas duas coisas afirmavam que já era um prazer enorme ter o privilégio de olhar outra vez para o Sr Rochester, olhasse ele para mim ou não. E acrescentavam – ‘Apresse-se! Apresse-se! Fique com ele enquanto pode. Apenas mais uns poucos dias ou semanas, no máximo, e depois se separará dele para sempre.’ Então estrangulei a nova agonia que acabara de nascer, uma coisa distorcida com a qual não podia compactuar. E corri em frente.”

“... Sim, esse é mais um de seus truques. Não pedir a carruagem e vir fazendo barulho pelas estradas e caminhos como qualquer mortal, para infiltrar-se pelas vizinhanças da sua casa junto com o crepúsculo, como se fosse um sonho ou uma sombra. Que diabos a senhorita fez consigo mesma durante este mês que passou?
- Estive com minha tia que morreu.
-Uma resposta típica de Jane! Que os bons anjos me protejam! Ela vem de outro mundo, da residência de pessoas que estão mortas. E diz isso ao me encontrar aqui sozinho no crepúsculo! Se eu tivesse coragem a tocaria para ver se é feita de matéria ou se não passa de uma sombra, ou se é um duende! Mas seria o mesmo que ir ao pântano para me apoderar de um fogo-fátuo. Irresponsável! Irresponsável! – acrescentou ele...”

“- Eu lhe digo que devo ir! – respondi, incitada por algo que beirava a paixão. – O senhor pensa que eu posso ficar para me tornar um nada para o senhor? O senhor pensa que eu sou um autômato? Uma máquina sem sentimentos? E que possa aguentar que tirem a migalha de pão de meus lábios e a gota d’água da vida de minha taça? O senhor pensa que por eu ser pobre, sombria, simples e pequena, não tenha alma ou coração? Se pensa, está enganado! E se Deus me tivesse presenteado com alguma beleza, e mais riqueza, eu tornaria tão árduo para o senhor deixar-me o quanto me é árduo deixá-lo agora. Não estou falando neste momento seguindo as normas de conduta e convencionalismo, tampouco com a carne mortal. É o meu espírito quem se dirige ao seu espírito, como se ambos estivessem mortos e estivessem aos pés de Deus. Como iguais. Que é o que somos!”

“- Não sou um pássaro, e não fui presa em uma armadilha. Sou um ser humano livre com minha vontade independente, que ora exerço para deixá-lo...
- A sua vontade decidirá o seu destino – disse ele. – Ofereço-lhe minha mão, meu coração e uma parte de tudo o que possuo...”

“- Você estava corada e agora está branda, Jane. Por que isso?
- Porque o senhor me deu um novo nome, Jane Rochester que parece tão estranho.
- Sim, Sra Rochester – disse ele. Jovem Sra Rochester, a jovem noiva de Fairfax Rochester.
- Nunca vai ser assim, senhor. Não sou como tal. Os seres numados nunca desfrutam de uma felicidade completa neste mundo. Eu não nasci para um destino diferente do restante dos meus semelhantes. Imaginar esta sorte que caiu sobre mim é como um conto de fadas, como um sonho.”

“O amor mais verdadeiro que o coração
Em seu âmago jamais havia despertado, 
Percorreu cada veia de modo acelerado
Como a maré que verte em profusão.

Sua chegada era a esperança de cada dia,
Sua partida, feita de dor e tormento,
O acaso que retardava seu advento
Era o gelo que em cada veia corria.

Sonhava com esta inominável ventura,
Ser tão amado como eu amava,
E era este o objetivo que eu buscava
Cego e ansioso em meio à procura.

Mas largo era o espaço inacessível
Que entre nossas almas estava colocado
Tão perigoso como a espuma do mar ondulado
Nas ondas verdes do oceano imprevisível;

E assombrado como o caminho do ladrão
Através do deserto ou da floresta densa;
Pois que o Poder, o Direito, a Ira e a Ofensa
Entre nossos espíritos prometem união,

Afrontei os perigos, ri dos impedimentos,
Os maus augúrios foram desafiados,
De forma impetuosa foram ultrapassados.
Alertas, ameaças, agonias e sofrimentos.

Apressou-se meu arco-íris em seu arrebol
E voei como num sonho estonteante;
Pois se ergueu diante de mim triunfante
Aquela criança feita de chuva e sol.

Ainda brilhante nas nuvens de árdua escuridão
Onde a luz da alegria suave e solene aflora
Se densos ou implacáveis, não me importa agora, 
 Forem os desastres que se juntarão,

Não ligo se nessa ocasião delicada
Depois de tudo o que passei o tempo inteiro
Venha sobre mim o grilhão forte e ligeiro
Com a dor da vingança proclamada,

Mesmo que o Ódio altivo me derrubasse,
E o Direito me trouxesse a obstrução sem fim,
E o Poder opressor, com a cara fechada e ruim
Uma inimizade eterna por mim até jurasse.

Meu amor colocou sua pequena mão
Sobre a minha com um nobre sentimento
E jurou que o laço sagrado do casamento
Entrelaçará a essência de nossa união.

Meu amor jurou, e fez de seu beijo um selo
Para comigo viver até a hora da partida
E por fim possuo a bênção merecida
Porque amo e sou amado com desvelo!”


“’Vá embora agora mesmo de Thornfield.’
Disse a mim mesma que ainda não estava pronta para ouvir aquelas palavras.
‘Não ser mais a noiva de Edward Rochester é parte mínima da minha infelicidade’ – afirmei
.
‘Ter despertado dos sonhos mais gloriosos, descobrir que todos eles eram vazios e inúteis, é um horror que posso suportar e dominar. Mas ter que deixá-lo para sempre, instantânea e completamente, é algo intolerável. Não posso fazer isso’.”

“- Finalmente você saiu – disse ele. – Bem, estive por muito tempo à sua espera e escuta. Mas não ouvi qualquer movimento nem sequer um soluço. 5 minutos a mais desse silêncio mortal e eu teria forçado a porta qual um ladrão. Então você me evita? Você se trancou aí e sofria sozinha! Seria melhor ter saído e me censurado com veemência. Você é passional. Eu esperava que fizesse uma cena. Estava preparado para uma torrente de lágrimas. Apenas queria que ela fosse derramada sobre o meu peito. Entretanto, foi recebida por um chão sem sentimentos ou por seu lenço já encharcado. Mas me enganei. Você não derramou uma lágrima! Vejo um rosto branco e uns olhos murchos, mas nem sinal delas. Suponho então que seu coração deve ter chorado sangue, não? Então, Jane, nem uma palavra de censura? Nada cáustico? Nada pungente? Você fica parada aí onde a coloquei e apenas me olha com um olhar cansado e passivo. Nunca tive a intenção de feri-la dessa maneira, Jane. Se o homem que tivesse apenas uma ovelha a qual queria tanto quanto a uma filha, que comesse do seu pão e bebesse de sua taça, e se deitasse em seu peito, a tivesse sacrificado por engano do matadouro, não iria arrepender-se do engano sangrento mais do que eu me arrependo do meu. Será que você algum dia me perdoará?
Leitor, eu o perdoei ali mesmo, naquele momento e naquele lugar. Havia um remorso tão profundo em seu olhar, tamanha compaixão em seu tom, e uma energia tão varonil em suas maneiras! E, além disso, havia a demonstração de um amor que não mudara, em seu olhar e em seus modos, que o perdoei por completo. Sem palavras, sem exteriorizar meu perdão, mas o perdoei do fundo do meu coração.”

“Seria bom se eu pudesse perder a vida agora, sem sentir uma dor forte – pensei – pois então não teria de machucar as emoções profundas do meu coração afastando-as das do Sr. Rochester. Ao que parece, preciso deixá-lo. Mas não quero deixá-lo e não posso deixá-lo.”

“Senti que me tornava benquista nas redondezas. Ouvia por todos os lados saudações cordiais, toda vez que saía, e era sempre acolhida por sorrisos gentis. Viver admirada pelas pessoas – embora fossem trabalhadoras e humildes – é como estar sentada ao sol calmo e doce, onde serenos sentimentos íntimos desabrocham e florescem sob seus raios de luz.”

“Às vezes as pessoas reservadas têm uma necessidade maior de uma discussão franca de seus sentimentos e aflições do que aquelas que são expansivas. As pessoas estóicas e sérias são humanas, afinal de contas , e irromper no mar silencioso de suas almas com audácia e boa vontade é fazer-lhes um grande bem inesperado.”

“- Bem, senhor, eu ficarei ao seu lado. Como já disse.
- Sim, mas você entende uma coisa, quando diz que ficará comigo, e eu entendo outra coisa. Você, talvez, pudesse ter em mente ficar ao meu lado para me ajudar e servir-me como uma enfermeira, pois tem um coração bondoso e um espírito generoso que a deixa sempre pronta a se sacrificar por aqueles de quem tem pena. Isso sem dúvida deveria ser suficiente para mim. Eu por minha vez não deveria ter por você outros sentimentos que não os de um pai. Não é assim que pensa? Vamos, diga-me.
- Pensarei o que o senhor quiser, senhor. Fico contente em ser apenas sua enfermeira, se é o que o senhor acha melhor.”


“_ há um encantamento até agora por estar com você. Quem é que pode calcular que vida escura, terrível e sem esperança tenho vivido há tantos meses? Sem nada para fazer, esperando pelo nada. Vendo a noite se ligar ao dia. Não sentindo outra coisa senão o frio quando o fogo se apaga, fome quando me esqueço de comer e um a tristeza infinda. Às vezes surge um delírio pelo desejo de contemplar minha Jane de novo. Sim, pois era a volta dela que eu desejava, muito mais do que a volta da minha visão perdida. Como posso agora acreditar que Jane está comigo e dizendo que me ama? Será que ela não irá partir tão subitamente como chegou? Amanhã, temo que não possa mais encontrá-la aqui.”

Nota: 5/5 + FAV!!!

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